quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Qual é a cor da imbecilidade?

 Meu texto de hoje vai permear um caminho diferente dos que costumo escrever aqui no blog, pois estes geralmente são cheio de metáforas, hipérboles, sinestesias outras figuras de linguagem e demais elementos. Mas diante do ocorrido ontem que me levou a refletir o dia todo, eu me senti na obrigação de expressar tudo que senti e vi depois de ter feito um debate em uma escola com alunos de um projeto do qual faço parte. O assunto era cotas raciais. Pois bem, a questão das cotas não vem ao caso no instante, minha abordagem vem mais de encontro aos relatos desses jovens negros.
Em meio a esse debate sobre cotas, inevitavelmente caminhamos pra questão do racismo e ouvir aqueles jovens falando foi ao mesmo tempo uma das melhores experiências que tive enquanto pessoa (e como docente a melhor experiência, haja vista também minha baixa experiência como professor), mas do mesmo modo foi doloroso ouvi-los falando absurdos a respeito de preconceitos raciais que sofreram.
Uma aluna negra contou, na roda que fizemos, os diversos tipos de preconceitos que sofre desde o momento em que não é atendida numa loja, até pessoas que a chamam de macaca, de cabelo ruim dentre outras escrotices possíveis relacionadas a cor de sua pele. E ver um outro aluno relatando com dor o fato de sofrer racismo em diversas situações também me chocou. Bem, eu sempre tive noção de que o Brasil é um país racista, de que negros sofrem com isso e tudo mais, mas ontem foi diferente em diversos aspectos, e em função disso resolvi me colocar no lugar de um negro e pensar como seria ser negro, não só no Brasil, mas em qualquer lugar do mundo, pois o preconceito racial não é endêmico.
Bem, eu me autodeclaro pardo, apesar de muitos me considerarem branco por tentar me aproximar do “melhor” como sempre fazem. Assim me dizem que não sou pardo, mas que sou branco por não ter taaaanta melanina dando o ar de sua graça em minha pele assim, né? Mas eu também sofro preconceito, não o racial, mas o social. O meu acesso à cidade, tão discutido nos meios acadêmicos e movimentos sociais, é um dos casos. Já sofri preconceito nas regiões da Faria Lima, Higienópolis, por exemplo. São ambientes hostis, que te expulsam, quase que a ponta pé, desses territórios dessa elite escrota de São Paulo E diante dessas situações de discriminação eu me senti extremamente ofendido, acuado num ambiente que não parecia ser de meu pertencimento, porém eu ainda tenho meu território, meu lugar, pois sei que eu saindo dos Jardim Europa da vida, se eu estender o braço para um táxi às 3 da manhã, esse táxi tem a probabilidade de 90% de chance de parar, pois eles vão se valer do fato da minha cor de pele BRANCA pra assim decidir parar o carro, mas e para um negro será que esse mesmo táxi pararia? Eu nunca sofri enquadro policial muito menos tomei um tapa na cara de um deles, mas aposto que se você conversar com algum negro a probabilidade de ele falar ao menos um “sim, já fui abordado” é muito grande e não se espante se esse enquadro, por um acaso, for na região onde ele mora. O que me leva a concluir que se eu, “branco” e pobre, não quiser sofrer com preconceitos, eu tenho a possibilidade de não frequentar esses territórios elitistas e assim não sofrerei com isso, perderei meu acesso à cidade, fato, mas não serei discriminado, porém o negro sofrerá preconceito tanto no Jardins como na esquina de casa. O racismo vem de todos os lugares da cidade, do mundo, dos meios de comunicação, da porta giratória do banco, da perseguição a ele de um funcionário dento de uma loja, e etc, etc, etc. Esse tipo de desmoralização pode ocorrer a qualquer hora, em qualquer dia, em qualquer lugar a uma pessoa negra, isso quando não são vitimadas de assassinatos. Isso deve ser aterrorizante. E se adequar a essa situação, porém não tolerá-la e lutar contra, parece ser a única saída, porque senão você enlouquece pensando numa possível discriminação.
Os negros são desterritorializados, sem seus redutos, sem sua história contada, sem seus mártires, seus heróis, suas referências. Eles não possuem refúgios, são obrigados a conviver cotidianamente com os olhares tortos de populares, com o medo de andar pelas ruas escuras de casa e dar de cara com algum policial ávido por assassinar um negro, com as “brincadeiras” de cunho racista, com eufemismos do tipo “moreninho”, “escurinho”, “homem de cor” que revelam um racismo velado de uma sociedade hipócrita que não assume seu desvio de caráter.
 Pra quem nunca fez esse trabalho de tentar ao menos se imaginar como seria viver protegido por uma pele preta por um dia que seja, o faça. Evidente que nunca terão a dimensão da intensidade da dor de sofrer um ato racista, mas certamente notarão como é dolorido ser negro em uma sociedade que não os aceita, simplesmente os tolera… ou às vezes nem isso.
https://www.youtube.com/watch?v=cljZoDmZubw



Um comentário:

  1. Disse tudo!!!
    Porém, talvez devêssemos pensar nisso não só em relação aos negros...
    O problema não é apenas com a cor de pele, é o problema com o homem/mulher tatuada, é a opção sexual de fulano ou ciclano...
    O preconceito está em todo lugar...
    Não acredito que devam existir leis e afins para se proteger pessoas do preconceito, devem existir ensinamentos onde as pessoas aprendam a respeitar qualquer pessoa, sem se preocupar se ela é branca, parda, amarela ou negra...
    Sem questionar sua opção sexual, sua escolha de roupas e/ou profissão...
    O problema é que a humanidade ainda tem muito o que aprender, evoluir...

    Gostei daqui!!!

    Bjo, bjo!!!

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