A carta

 

"Assim, num dia de verão, as ondas se juntam, balançam e tombam; e o mundo inteiro parece dizer: “Isso é tudo”, cada vez mais forte, até que o coração, no corpo estendido sob o sol da praia, também diz: “Isso é tudo”. “Não mais temas”, diz o coração. “Não mais temas”, diz o coração, confiando a sua carga a algum mar que suspira coletivamente por todas as dores, e recomeça, ergue-se, tomba. E o corpo sozinho ouve a abelha que passa; a onda se quebra; o cão, lá ao longe, ladrando, ladrando… (p. 41)" Virginia Woolf no livro Mrs. Dalloway

"Sabe aquelas resoluções na vida tipo mudar de rumo radicalmente, cortar o cabelo, comprar roupas diferentes, mudar de cidade e profissão de repente? Talvez essa carta faça parte de algo tipo isso.

Talvez eu esteja encerrando alguma coisa da mesma forma como ela me veio... Um dia eu sentei com alguém numa mesa de bar que confessou que tinha armado situações para estar ali, de frente pra mim, sem eu nunca reparar. E agora eu estou aqui pra dizer a alguém que existiram situações em que nunca se havia reparado. rs estranho isso, as vezes a minha vida faz capítulos ou temporadas inteiras tentando , talvez, imitar bem porcamente um romance da Virginia Woolf haha...

Tudo isso pra dizer que eu sempre fui dessas que tem tesão pela vida, por mais estranha que ela seja. E eu gosto da maneira como ela me provoca, embora muitas vezes eu seja uma danada de uma covarde cabeçuda que gosta que as coisas estejam sob meu controle, a rédeas curtas...

A prova disso é que tenho um histórico amoroso desastroso (ou não), sempre fiz questão de me apaixonar por cafas, pq eles são muito bons de cama e pq são o que são, gostar conscientemente de um cafa é assumir que não se quer assumir nada.

E eu não queria mesmo. Era fácil demais me apaixonar por alguém sem futuro, pq eu não queria um rs! Sempre tive pavor de relacionamentos... Eles piram as pessoas com regras malucas, as engolem no tédio, desgastam tudo e eu curto dramas intensos, livres e loucos. Que pegam fogo e se consomem rapidamente.

O que eu não contava era aparecer alguém com uma espécie de kriptonita da Raquel.

Quando te "conheci" esqueci e ignorei (sei la o pq) o protocolo, me desarmei, me deixei levar, pirei completamente, tive uma pane irreparável no sistema.

Quando estava longe, me mostrava vulnerável, me descobri pouco a pouco e quando estava perto não tinha a menor ideia do que fazer e travava. Eu travei. Travei pq não tinha proteção nenhuma, deixei todas as portas abertas (pra vc entrar? Até hoje não sei. Mas deixei).

Eu nunca tinha agido de forma parecida, nem mesmo nas minhas paixões mais sem pé nem cabeça, se é que alguma consegue ultrapassar essa no quesito esquisitice haha

Foi meio assustador ser dominada. Foi meio assustador pensar que eu adorava ver suas reações e isso me tirou as rédeas. Adorava suas expressões, quando vc abaixava a cabeça e olhava por cima, com a boca meio de lado. Adorava seu jeito empolgado de me dizer as coisas. E te dei um presente só pra ver todas essas reações de uma vez! Pq eu queria te ver feliz.

Se essas paradas de sexto sentido existem, eu fui "avisada"; na primeira vez que passamos uma madrugada inteira conversando, eu soube que meu escudo não funcionava contigo.

E pela primeira e ,muito provavelmente também a última vez, eu me entreguei completamente a uma paixonite aguda, finalmente eu descobria o que era pular de cabeça e nem por um instante, quando estava perto de vc, raciocinei ou lembrei que alguma hora vc podia agir de forma diferente (porra, e a liberdade que eu sempre amei? Não disse que gostar e se relacionar, pira as pessoas? rs).

Talvez vc tenha sido mais um lance esquizofrênico que qualquer outra coisa, julgando pelo fato de que minha paixão mais intensa na vida tenha sido com vc e eu não faço a menor ideia de quem vc é. Mas pra mim pouco importa a esquizofrenia, rs, eu quase sempre lidei bem com ela e quando não consigo (nesse caso por exemplo), eu sinto que devo tentar arrumar, desfazer meus nós pra fazer as pazes com ela e seguir em frente. Acho que essa carta não tem outra intenção a não ser isso, fazer as pazes com a minha maluquice. E também pq é uma espécie de ritual de encerramento de fase, escrever um texto explicando tudo o que não parecia ter explicação (até o maior dos cafas egocêntricos que já passou por esse coraçãozinho surrado mereceu um desses, com vc -apesar de perder literalmente o timing- não poderia ser diferente).

Além do mais, se fosse eu iria gostar de saber que minha figura (mesmo que idealizada) tenha sido importante em algum momento na vida de algum beltrano, rs.

Ha um tempão atrás nós estávamos no carro procurando um subway e vc me perguntou:" vc tem nojo de mim?"

Eu não me lembro do que respondi, mas no meio de tanta falta de controle, apesar da vontade me consumir não só nas ocasiões em que ficamos, como um bom tempo depois disso, no meio disso a melhor coisa que fiz foi ter parado. Não era nojo, nunca foi. Era algo tão intenso que eu não tinha a menor condição de sentir sozinha. Por isso sempre amarelei.

E eu tb nunca quis destruir nd que vc tenha me dado, nem pedir pra sumir da minha vida. É só que eu tinha que ter um pouco de raiva pra ter ânimo e vontade de esquecer, de sufocar minhas alucinações- esquizofrênicas ou platônicas?. Desculpe por isso também. Até pq la no fundo eu virei as costas e não houve um só dia em que eu deixei de esperar que vc não me levasse a sério e não tivesse coragem de desaparecer... (rs ledo engano, hoje eu sei)

No mais, espero que tenha encontrado mulheres mais lúcidas e sensatas do que eu, rs. Espero também que o mesmo motivo que te fez afastar de mim, não te afaste outra vez de pessoas e momentos especiais... mesmo mentiras pequenas envenenam grandes histórias. (Sim, eu sei que vc mentiu algumas vezes e apesar de ter muita raiva e nunca entender o pq disso, esse é um dos detalhes que minha esquizofrenia e a memória seletiva passam por cima, formando alucinações intocáveis e perfeitas a seu respeito.)"

Confissões de Bar no Face!